O processo de digitalização envolve uma transformação organizacional, que exige um comprometimento total das empresas, iniciando pelos executivos e gerentes, que precisam trabalhar juntos para repensar o modelo operacional. Fazendo um paralelo, se nesse processo a tecnologia é o motor, as pessoas são o combustível. E sem combustível, o veículo não funciona.

A importância das pessoas é tanta que o gargalo desse movimento migrou de investimentos em tecnologia para investimentos em pessoas. O fator limitante nesta fase é o volume de colaboradores com capacidade para impulsionar a inovação digital. Para complicar a situação, a contratação desses “atletas digitais” para atender à demanda das empresas é quase impossível no mercado atual. No Brasil, o setor tem um déficit estimado de 400 mil profissionais, podendo chegar a 797 mil até 2025, de acordo com levantamento da Brasscom.

Rafael Araújo

Como consequência, os esforços em recrutamento devem ser complementados com um programa de treinamento e formação do grupo atual de colaboradores. Esse desafio é catalisado também pela necessidade de uma renovação da cultura organizacional, que precisa ter a mentalidade de inovação como parte do seu DNA, uma cultura que estimule experimentação frequente e falhas rápidas. Inclusive, algumas empresas estão premiando projetos internos que falharam, mas que trouxeram grandes aprendizados. Um exemplo de praticante desse modelo é o Grupo Tata, um conglomerado industrial Indiano.

No mercado de seguros esse movimento de transformação é ainda mais profundo.

Um estudo recente da Accenture aponta o mercado segurador como o setor com maior suscetibilidade para disrupção. O que não é uma surpresa, dado que o mercado segurador tem um histórico de ser tradicionalmente atrasado do ponto de vista tecnológico. Mas essa dinâmica está mudando, e rápido! As recentes mudanças regulatórias e entrada de insurtechs está forçando as seguradoras a pisarem ainda mais no acelerador da transformação digital.

Na frente regulatória, a Susep está promovendo uma agenda que tende a mexer na dinâmica competitiva do mercado. Por um lado, temos o programa sandbox regulatório, que reduz a barreira de entrada para novos players com soluções inovadoras. Por outro lado, o início do movimento do open insurance, que tende a estimular competição mediante autorização de compartilhamento de dados pelos consumidores – com um maior acesso a dados, as seguradoras poderão precificar melhor os seus produtos e serem mais competitivas nas suas ofertas.

Além das mudanças regulatórias, a entrada das insurtechs também está provocando uma mudança estrutural do setor. Essas empresas estão trazendo soluções que visam atender a demanda do consumidor de seguros, que busca produtos com coberturas personalizadas e uma experiência superior, tanto na compra do seguro como na gestão de sinistros. Aqui temos um ambiente de competição entre seguradoras incumbentes e insurtechs. Em muitas situações esses players atuam em colaboração, onde a insurtech ajuda no desenho do produto e atua como um canal de distribuição. Mas também existem casos de insurtechs atuando como MGA para resseguradoras, desintermediando as seguradoras.

Ambos os movimentos (mudança regulatória e entrada das insurtechs) são saudáveis para o consumidor de seguros, que tende a ter um produto melhor, com preço e experiência melhores. Mas isso acaba se traduzindo em um ambiente de alta pressão para as seguradoras, que já percebem a digitalização como peça fundamental para se tornarem players relevantes no ecossistema de seguros.

A vida das seguradoras não está fácil. Com cerca de 50% do prêmio emitido comprometido com sinistros, 25% com distribuição e em torno de 15% de despesa administrativa, sobra pouco espaço para investir em iniciativas de inovação. E nesse ambiente tão complexo e dinâmico, as seguradoras precisam focar no seu core business. Para tanto, as seguradoras precisam olhar para fora e entender melhor o consumidor e a sua jornada; com isso poderá desenhar produtos que enderecem as necessidades e permitam uma experiência sem fricção para o consumidor. O desenvolvimento de parcerias com insurtechs pode ser uma boa alternativa de canal de distribuição, trazendo uma penetração rápida, com baixo nível de recurso para viabilização. As seguradoras também precisam olhar para dentro de casa e desenvolver iniciativas de melhorias de eficiência e agilidade operacional – através de otimização e automatização de processos internos.

Dito isso, é fundamental que as seguradoras desenvolvam parcerias com outros players do ecossistema, seja com parceiros de distribuição, ou com parceiros de tecnologia. Independentemente da abordagem, a tecnologia precisa estar hoje no centro da estratégia de seguradoras. E essa adaptação não vai acontecer somente por meio de máquinas, mas por meio de profissionais capacitados e interessados nas melhorias que ela traz para gerar valor e conveniência ao consumidor.

* Por Rafael Araújo, CEO da i4pro

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